1. O que é educação STEAM?

Existem muitas definições e especialmente interpretações para a educação STEAM, mas de maneira geral, ela é uma política de educação baseada em projetos, que integra as áreas de Ciências, Tecnologia, Engenharia, Artes e Matemática – origem do acrônimo STEAM, do inglês, Science, technology, engeneering, arts and math.

Essa integração entre as cinco áreas pressupõe que os estudantes coloquem a mão na massa para solucionarem desafios de forma ativa, utilizando conhecimentos prévios e desenvolvendo novas aprendizagens, de forma contextualizada e com aplicação prática. De maneira bem ampla, a educação STEAM é uma metodologia ativa de ensino e aprendizagem baseada em projetos e que, dado seu caráter multidisciplinar, prepara os alunos para os desafios do século XXI à medida em que os auxilia a desenvolver valores e habilidades socioemocionais.

2. Qual o histórico? Como surgiu, onde, motivações, objetivos.

O movimento surgiu nos EUA quando, no início dos anos 2000, alguns relatórios apontaram a queda do interesse de jovens em seguir carreiras profissionais da área de ciência, tecnologia, engenharia e matemática, o que se deveu, em grande parte, ao modelo de ensino tradicional e ultrapassado de transmissão de conhecimentos de forma rígida e sem aplicação prática, sem mão na massa. Como consequência, o país logo percebeu o impacto negativo que este fator poderia ter na criação de mão de obra qualificada para o desenvolvimento de pesquisa e inovação – os motores da economia! – afetando não somente os indicadores de desempenho escolar (como o PISA, por exemplo), mas também a indústria como um todo.

Assim, dada essa demanda, criou-se esse currículo STEM para endereçar essa demanda e fomentar o interesse dos estudantes pelas carreiras em Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática (STEM, inicialmente sem o “a”, de artes), e ações foram implementadas para que a reforma curricular ocorresse rapidamente para contemplar essa necessidade.

3. Além das disciplinas, essa abordagem inclui metodologias, certo? Pode detalhá-las como funcionam, com exemplos?

A aprendizagem em STEAM ocorre principalmente a partir de um desafio proposto pelo professor aos estudantes. A metodologia de aprendizagem baseada em projetos envolve a investigação do tema de estudo e o desenvolvimento de etapas para resolver o desafio apresentado, que pode ter duração de uma aula ou até meses.

De maneira bastante diferente das aulas expositivas tradicionais, em que os estudantes ficam sentados e o professor fica “palestrando” sobre o conteúdo, na aprendizagem STEAM os alunos e alunas são convidados a investigarem, proporem ações, criarem soluções e desenvolverem protótipos, produtos ou propostas das áreas STEAM que se relacionem com o problema. Por si só, esta abordagem ativa envolve o estudante no tema da aula e aguça sua curiosidade – que vem sendo cada vez mais reduzida nos jovens, que possuem todas as respostas na palma de suas mãos, em um smartphone, e que assistem cerca de 5h de aulas por dia em que as respostas são dadas juntamente com as perguntas pelos próprios professores.

4. Quais as vantagens de se ensinar/aprender dessa forma?

Graças à metodologia de projetos e à contextualização multidisciplinar, essa abordagem enfoca na vivência prática do método científico e estimula a produção de novos conhecimentos, e não apenas da reprodução ou na memorização do que se ouve em sala de aula.

Assim, dentre as vantagens de se aprender desta forma, pode-se citar o incentivo à criatividade e à curiosidade por diferentes temas, resolução de problemas e autonomia para aprendizagem, uma vez que o professor atua como mediador e orientador do processo – para os docentes, outra vantagem é também poder aprender sempre coisas novas com seus estudantes, pois uma aula STEAM nunca é igual à outra!

5. Como educadora dessa área, como observa os resultados de aprendizado nos alunos com quem tem contato?

Percebo em meus alunos maior autonomia e desenvoltura para solucionar problemas e conflitos, adoção de uma comunicação fluida e de muitas alternativas criativas para transporem os desafios que encontram nos projetos que desenvolvemos.

Isso se extrapola também para suas atividades cotidianas e não apenas na sala de aula, contribuindo para que sejam cidadãos mais críticos, mais resilientes, mais reflexivos e mais colaborativos, além de tolerantes à diferentes pontos de vista e opiniões. Essas são habilidades essenciais para o cidadão do século XXI, que deve se adaptar constantemente às rápidas mudanças da sociedade e a tantos desafios que encontramos em nossa rotina.

6. Quanto mais cedo o estudante ter contato com a educação STEAM melhor? Existe uma defasagem quando se começa o aprendizado STEAM mais tarde?

Sim. O contato com a abordagem STEAM estimula ainda mais a curiosidade, interesse pela área, afinidade pelas disciplinas e facilita a compreensão do funcionamento das coisas, além de auxiliar o aluno no desenvolvimento de habilidades socioemocionais, de resolução de problemas, criatividade, trabalho em equipe.

Por ser uma abordagem focada nos estudantes como protagonistas do processo, ocorre mais rapidamente o desenvolvimento de autonomia e incentivo à participação, tornando os estudantes mais interessados na aprendizagem e no funcionamento das coisas.

7. Como analisa a abrangência e qualidade da educação STEAM hj no Brasil?

Infelizmente, a adoção da educação STEAM é mais centrada nas escolas privadas, possivelmente por que normalmente associa-se (de forma equivocada) a necessidade de se ter infra-estrutura muito robusta para desenvolver atividades “hands on”, fato que não ocorre em todas as escolas públicas na realidade brasileira. Assim, a educação STEAM tornou-se muito exclusiva e vista como um diferencial, especialmente em escolas que atendem parcelas da população com nível econômico mais elevado e que podem pagar por cursos extra-classe de robótica, oficina maker, programação, entre outros. É preciso enfatizar que essas atividades não são, por si só, a educação STEAM, considerando que há uma falha na interpretação ou compreensão do seu real significado.

No entanto, existem pouquíssimas iniciativas por parte do estado para implementar o ensino STEAM em escolas públicas, ficando esse desafio a cargo de entidades como a Fundação Siemens, por exemplo, além de algumas ONGs para desenvolver a formação de professores e alavancar e difundir o currículo STEAM.

8. Pode contar cases brasileiros que sejam referência?

Como já foi dito, sabemos que a educação STEAM no Brasil não é tão difundido como em outros países como os EUA, por exemplo, que possui uma política educacional para implementar esse currículo em suas escolas. Assim, das iniciativas que encontramos no país, podemos citar o próprio programa Experimento da Fundação Siemens e também o STEM Brasil, da Worldfund (https://educando.org/pt/stem-brasil/), que é uma rede nacional de formação de professores.

Atualmente tem-se discutido muito sobre as reformas na educação brasileira, e as características da educação STEAM podem ser encontradas na reforma do Ensino Médio e na BNCC, que já adota o ensino por áreas do conhecimento e não mais por disciplinas, por exemplo.

9. No cenário internacional, onde a educação STEAM se destaca? Por quê?

Além dos Estados Unidos, onde a proposta teve sua origem e é mais largamente difundida como uma política pública educacional, podemos citar o trabalho desenvolvido em outros países como Alemanha, Austrália e também alguns mais próximos de nós (geográfica e socialmente), como Peru, México e Chile, por exemplo, em que há muitas iniciativas públicas e privadas financiadas e apoiadas por diversas instituições que merecem destaque.

10. Qual seu contato/relação com a Fundação Siemens?

Comecei a trabalhar e apoiar os projetos da Fundação Siemens em 2017, quando atuava como assessora pedagógica da área de Ciências da Natureza em uma rede de ensino privada no Brasil, com quem a Fundação mantém parceria com o Programa Experimento 4+ e 8+. Desde então, fui formada pela Fundação para adotar a metodologia da aprendizagem por investigação e aplicar os conceitos STEAM utilizando os kits com os estudantes, além de elaborar e conduzir formações iniciais e continuadas com docentes responsáveis por esta aplicação com seus alunos na mesma rede de ensino. Para minha formação em STEAM e como professora formadora do Programa Experimento, a Fundação oportunizou a minha participação em diferentes cursos, workshops e eventos nacionais e internacionais sobre STEAM e experimentação científica, que continuamente fomentam meu interesse e atuação na área e fortalecem nossa parceria no desenvolvimento do Programa Experimento no Brasil.

11. O que pode comentar sobre o trabalho desenvolvido pela Fundação Siemens?

Sou grande fã da proposta do trabalho com o Programa Experimento e a forma como ele se espalhou por todas as regiões do nosso país. A contrapartida da Fundação de oferecer estudos e oportunidade de formação continuada, para capacitar seus parceiros, está intimamente relacionada aos pilares da proposta do Programa STEAM, encorajando sempre o “aprender a aprender” e dando condições para que os educadores se vejam como eternos pesquisadores juntamente com seus alunos. O acompanhamento muito próximo que a Fundação mantém com seus parceiros em seus projetos é o alicerce fundamental para garantir bons resultados na sua proposta de fomentar o interesse pelo ensino e aprendizagem de ciências, difundir boas práticas em educação STEAM e renovar a forma de aprender e desenvolver habilidades do cidadão do século XXI de maneira divertida, contextualizada e inovadora.

12. A educação STEAM seria o caminho para melhorar a posição brasileira no ranking PISA e outros indicadores que mostram um desempenho pior do que os demais países, principalmente em matemática?

Certamente é um dos caminhos necessários. Aliás, esse foi um dos motivos pelo qual o currículo foi inicialmente criado, nos EUA. Sabemos que quando um aluno gosta de uma matéria ou assunto, ele se dedica e estuda com afinco, querendo aprender sempre mais e estimulando-se a nunca parara de ler e aprender sobre isso. No entanto, devido ao tradicionalismo educacional que explora o ensino por aulas expositivas desinteressantes e enfadonhas, os alunos perdem o interesse pela aprendizagem e, portanto, tendem a apresentarem desempenhos cada vez menores. Assim, reformular a maneira como os assuntos são abordados na escola é um caminho para estimular os alunos a aprenderem e a gostarem de aprender, e, subsequentemente, melhorando sua aprendizagem, que vai ser traduzida em melhores resultados.

13. De que forma prática essa melhoria poderia acontecer?

A vivência da prática da metodologia científica é a forma pela qual podemos melhorar a compreensão dos estudantes sobre as diferentes disciplinas, conteúdos e habilidades que são tratados nos diferentes temas durante um projeto STEAM.

14. STEM ou STEAM? Quais as diferenças práticas com a inclusão da arte? Qual das duas é mais difundida?

Conforme já foi dito, o STEM, sem o “a” de Artes, nasceu nos anos 2000 nos EUA, e sua concepção enfatiza as ciências exatas. Essa “adição” da arte na proposta ocorreu mais recentemente, quando se notou que o STEM poderia se encaminhar para uma prática curricular segmentada, assim como nos modelos tradicionais que têm aulas por disciplinas que se encerram em si mesmas. A proposta de incluir a arte no currículo traz uma abordagem diferente para o desenvolvimento do método científico, explorando a expressão da criatividade e dando mais espaço para temas como design, linguagem, arquitetura, fotografia, entre outros.

No entanto, deve-se alertar para que a inclusão da arte não seja apenas vista como uma ferramenta, como ocorre em muitos projetos por falta de compreensão mais aprofundada da importância e do papel que esta área pode ter. Por exemplo, realizar um projeto “STEM” não tornará a experiência “STEAM” se os estudantes pintarem, desenharem ou mesmo elaborarem a escultura ou o protótipo.

15. Como ficam as disciplinas de humanas nessa abordagem?

O STEAM pressupõe um currículo interdisciplinar que relaciona tópicos de estudo da história e a filosofia da Ciência, muito semelhante a uma abordagem educacional conhecida como CTS (Ciência, Tecnologia e Sociedade), descrita em diversos materiais e documentos oficiais (exemplo: PCN – parâmetros curriculares nacionais). Isso implica o estudo da ciência de forma indissociável da contextualização social e de abordagens de resolução de problemas, e iniciativas que excluem as ciências humanas da educação STEAM falham em promover a integração rica e que é de fato o diferencial da abordagem. No entanto, existem muitas propostas que excluem artes e ciências humanas do currículo, supervalorizando apenas as ciências exatas em detrimento de outros conhecimentos contextualizados, que realmente auxiliam na aplicação prática do que se aprende e oportuniza o desenvolvimento de habilidades socioemocionais.

16. Como lidar com a rejeição de alunos que têm mais facilidade em exatas em relação a humanas e vice-versa?

A heterogeneidade é muito oportuna e bem vista para se trabalhar com a educação STEAM, uma vez que ela é baseada em projetos e concebe a adoção de grupos de trabalhos em todas as propostas. Assim, o trabalho em equipe pressupõe a necessidade de colaboração e o fato de haverem alunos com interesses e afinidades diferentes pode contribuir muito com a solução dos problemas e desafios propostos, uma vez que a criatividade dos alunos, somada à “skills complementares” e variadas pode ser o diferencial para projetos inovadores!

17. O que é preciso fazer, adaptar e mudar para se adotar STEAM em uma escola?

A equipe pedagógica da escola precisa ter em mente que a adoção do STEAM não é apenas desenvolver uma atividade diferente e mão na massa, mas sim a incorporação das cinco áreas de maneira propositiva com metodologia baseada em projetos, o que é um desafio para as escolas tradicionais, que precisarão adaptar seu planejamento para adotar um currículo menos segmentado em disciplinas e mais flexível do ponto de vista da interdisciplinaridade, trabalhando por temas ou competências, e não conteúdos e disciplinas. Além disso, o ponto crucial para implementar o STEAM é investir na formação dos professores que conduzirão as aulas, uma vez que eles precisarão reunir conhecimentos das cinco áreas e especialmente das metodologias e estratégias próprios da aprendizagem baseada em projetos. Apesar da infra-estrutura não ser uma condição sine qua non para a implementação do projeto STEAM na escola, possuir tecnologia e materiais diversos (sucata, madeira, plásticos, canudinhos, etc) para a criação de protótipos e realizar atividades mão na massa e um espaço próprio para essas aulas é o ideal. Há diferentes formas de aplicar o STEAM, seja no período regular ou em oficinas de contraturno, por exemplo, incorporando programação e robótica no currículo para a criação de protótipos.

Por fim, culminar a finalização dos projetos com a apresentação em uma feira de ciências ou em um evento STEAM é uma excelente oportunidade para divulgar as aprendizagens para a comunidade escolar.

18. O educador/escola que quer ter contato com essa metodologia, quais os melhores caminhos?

Há muito material na internet para começar os estudos sobre STEAM, seja em redes sociais, blogs ou canais que postam materiais e divulgam as experiências vivenciadas com aulas STEAM e que podem servir de inspiração e gerar ideias para conhecer e se apaixonar pela metodologia. Há o site Science Buddies que possui um blog (http://www.sciencebuddies.org / https://www.sciencebuddies.org/blog ) muito interessante, apesar de estar em inglês, mas vale a pena conferir.

19. Por fim, poderia passar seu nome completo e um breve resumo de suas experiências acadêmica e profissional, incluindo o que faz atualmente?

Mariana Abrahão, 32 anos, bióloga e educadora.

Possuo graduação em Ciências Biológicas (2008) e atuei como pesquisadora até 2015, quando concluí meu doutorado em Biossistemas – fato que me fez decidir que queria me comprometer total e completamente com a educação científica no Brasil. Desde minha graduação, atuo como docente na educação básica desde 2009, ministrando aulas de ciências, biologia e química para estudantes de ensino fundamental II e ensino médio, além de lecionar no ensino superior desde 2016 em cursos de graduação e pós-graduação. Trabalhei como Assessora Pedagógica nacional da área de Ciências da Natureza (quando iniciei meu trabalho com a Fundação Siemens como coordenadora do Projeto e formadora de professores) e como Consultora Pedagógica para redes privadas de ensino básico no Brasil. Tenho experiência com formação de professores de educação básica e também formação de educadores STEAM. Atualmente trabalho como coordenadora pedagógica em uma rede de escolas do ABC paulista e continuo minha parceria com a Fundação Siemens e com o Programa Experimento, apaixonada pela Educação STEAM 😊